Friday 19 November 2010

O português que compôs o Hino da Aliança

Corria o ano de 1945, estava Berlim bloqueada pelos soviéticos e a Europa e os EUA a discutir a formação de uma aliança militar, quando José Frederico Ludovice se sentou a compor. Naquela altura não podia imaginá-lo, mas a partitura que estava a escrever, meses depois, seria seriamente considerada para se tornar no hino da NATO e durante anos décadas confundida como tal.

A história improvável do hino do arquitecto e compositor português teve em Humberto Delgado um dos personagens principais. Foi o "General sem Medo" que, impressionado com a composição, a levou para a América e se bateu por ela junto dos responsáveis da Aliança, onde era oficial político.
Nos anos seguintes foi tocada em algumas cerimónias nos EUA e era ouvida na rádio em Portugal e na Europa, mesmo do lado de lá da Cortina de Ferro .
Tanto quanto se sabe, foi tocada pela última vez, em 1989, pelos coros de Bruxelas, no Quadragésimo aniversário da Aliança. No programa das cerimónias consta o "Hino Atlântico". Lia-se que era "a única obra de coro escrita especialmente para a NATO". A partir dali, Leopoldo, filho do compositor falecido em 2007, perdeu-lhe o rasto. "Talvez ainda seja tocada, talvez se tenha perdido, enterrada na história da NATO." Ao que o DN apurou, o Hino Atlântico não é tocado hoje, na Cimeira de Lisboa.

O nome "Hino do Atlântico" foi a segunda escolha de José Ludovice. À sua partitura, que devia fundir a vivacidade dos franceses com a solenidade dos alemães, começou por chamar "Europa em Marcha". A referência ao Atlântico foi sugerida por Delgado, que já pensava na sua adopção pela NATO. A letra, a segunda versão, foi escrita em inglês por Ramiro Guedes de Campos.

A primeira resposta que Ludovice teve dos oficiais da NATO foi uma carta de um capitão da Marinha americana, a 17 de Novembro de 1952. G. W. Campbell escreve que o hino é "bonito e inspirador" e pede autorização para que seja tocado no coro de um couraçado americano. Campbell avisa porém que só em Paris o podem declarar hino da organização.
Um mês depois essa missão estava em marcha. A 4 de Dezembro de 1952, o DN noticiava que o delegado permanente de Portugal junto do Conselho Atlântico, conde de Tovar, "deverá hoje entregar em Paris, nos departamentos oficiais da organização". A Emissora Nacional passava a música antes do noticiário da NATO.
Muitos anos depois, em 1887, José Ludovice escreveu ao secretário-geral da NATO a contar a história da música e a perguntar se ela ainda era tocada e porque é que nunca tinha sido aprovada. A 6 de Abril de 1989, a resposta chegou. O oficial de ligação de Portugal na NATO A. J. Soares informava que o Hino do Atlântico fora "retomado pelo Grupo Coral da Casa do Pessoal da OTAN".
"Durante a recepção que ontem se realizou na sede desta Organização para celebrar os 40 anos da assinatura do Tratado do Atlântico Norte [...], o grupo coral executou o Hino Atlântico, tendo no final sido muito aplaudido." No envelope, estava uma fotografia do secretário-geral Manfred Warner com dedicatória para José Frederico Ludovice.

Tags: Política, Lisboa, NATO
IN: Diário de Notícias de 19 de Novembro de 2010

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