Tuesday 23 December 2008

Conference/Entrevista

(2º parte...)

Architecture and music
ARQUITECTURA E MÚSICA

As obras angolanas de um arquitecto moderno, Frederico Ludovice

(...) Ludovice concebeu alguns dos mais originais objectos arquitectónicos do Lubango, os quais viriam a ser emblemáticos da urbe e de seus arredores.
Trata-se de um conjunto coerente de pequenos monumentos modernos, aos quais a sensibilidade fina e «musical» do seu autor, deu um sentido de leveza e alguma espiritualidade, como o Pórtico-Esplanada para a Senhora do Monte (topónimo de origem islenha, lembrando o monte funchalense), de 1962, cuja silhueta dinâmica, em viga de betão curva, nasce de uma geometria regrada em planta; a entrada pórtico em betão, de sentido estrutural e expressão elegante, para o recinto da Feira, com o respectivo Pavilhão de Exposições – uma obra de conjunto, com desenho de amplo arco encastrado em pilares, que também porticam o Pavilhão; os Arcos da cidade, no Parque da Senhora do Monte (cuja capelinha votiva também recuperou) e o Monumento ao general João de Almeida,1963.

Na cidade edificou ainda a sua casa própria (moradia onde desenhou tudo, até o mobiliário) e, nos arredores concebeu uma pequena obra mista em betão e madeira, o pavilhão restaurante da Pousada da Leba na Tundavala em 1962 –onde os construtores locais lhe ensinaram o uso dos pilares na resistente madeira regional, cuja seiva era auto-protectora contra os infestantes (utilizada na ampla varanda frontal do edifício).

Trabalhou igualmente em diversos equipamentos e conjuntos industriais e infra-estruturais, no Lubango e em Luanda, como as instalações da Casa Inglesa e as instalações fabris Lupral, ambas no Lubango e a fábrica de montagem de camiões Izuzu, em Luanda. Ainda de referir a concepção das instalações da Mercedes Benz e da Central de Camionagem EVA. No campo infra-estrutural, mencione-se a estação Gare de Serpa Pinto, actual Menonge e os apeadeiros e casas para trabalhadores na linha férrea para Moçâmedes, hoje Namibe.

A concepção, implementação e construção novos centros urbanos era um processo activo nas décadas de 1960-70 em Angola e Moçambique. Ludovice participou amplamente nesta gesta, como urbanista, tendo desenhado os planos urbanísticos para Vila de Santo António do Zaire, actual Soyo, (no extremo Norte do território),Caluquembe, Vila da Ponte, Porto Alexandre, actual Tombua, (na costa Sul de Angola), Quilenges, Matala (antes Vila Paiva Couceiro),Vila Roçadas, hoje Xangongo, (no Sul Interior) e Vila Pereira d´Eça ( actual N´giva ou Ondjiva, (perto da fronteira Sul),Nauila e Humbe – núcleos estes na sua maioria concretizados. Se analisarmos a sua localização geográfica, verificamos constituírem o gérmen de uma autêntica primeira rede proto-urbana em toda a área a Sul da cidade do Lubango, ao longo do Cunene e até ao Cuando-Cubango.

Hoje retirado, tendo escolhido a paisagem do Sobral para residência (ao que diz, pelo que lhe recorda África), Ludovice rememora-nos episódios, personalidades, amigos, toca-nos composições no seu piano. O filho, Leopoldo Ludovice, organizou cuidadosamente a documentação profissional do pai ( além de ter investigado toda a biografia e obra do ascendente, o arquitecto, setecentista) e prepara uma exposição evocativa, numa homenagem em vida que Frederico Ludovice, o afável arquitecto, poeta e músico, bem merece.

Texto: Arquitecto José Manuel Fernandes (Faculdade Belas Artes de Lisboa) 17 Dezembro 2005 Actual/Expresso

Saturday 6 December 2008